O fios ficam elásticos quando molhados

 A água caía e enxaguava meus cabelos que passaram o dia inteiro com óleo de coco e eu me lembrei, do nada, de quando Martín tinha menos de um ano e eu quis acreditar que seria uma mãe artista e descolada e usei uma lata de leite em pó e uma de nescau vazias pra fazer dois tambores com sons distintos - uma, com arroz, outra, com feijão. No banho, 5 anos depois, eu ri. Não fui nem capaz de colorir as lata pra deixá-las atrativas pra criança, apenas as encapei com fita crepe. Uma piada.

O cabelo dá sinais. Ele precisa ser cortado. Eu preciso ser cortada, nos cabelos. Caem aos montes. Acordo todos os dias com algum fio enroscado em alguma parte do corpo. Por causa do calor infernal, passo meus dias com eles presos num coque infame que me deixa ainda mais envelhecida. Tinha me prometido que deixaria crescerem ao longo de todo o ano de 2024 para, então, passar a tesoura. Mas não sei se vou aguentar esperar por tanto tempo. Insegurança bate quando penso que o corpo tem uma largura que tornará minha cabeça ainda menor caso eu corte os fios. Mas por outro lado, foda-se. Quem se importa?

Durante muito tempo eu tive medo. Tive vergonha. Achava que deixaria de parecer feminina ou atraente se o cabelo fosse curto. Mas hoje... Meu deus, isso já passou há tanto tempo! Este tipo de preocupação já não cabe mais em minha vida.

A tarde em casa foi bom. Quero ser uma boa mulher. Lavei as roupas de escola do meu filho e tirei o encardido do uniforme. Esfreguei cuidadosamente as mangas suadas das camisas de meu marido. Um cuidado invisível que nunca tive. E que, eu sei, me demanda tempo. Mas decidi fazer. Com amor. Aproveitei as cuticulas amolecidas e fiz as unhas. E então besuntei meus cabelos. 

Esse texto é pra desenferrujar. Talvez eu volte a escrever aqui. Talvez eu volte a postar. Talvez eu comece a partilhar.


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